Tanto ortodoxos quanto católicos romanos celebram o mistério no qual Cristo toma Sua Mãe, corpo e alma, aos Céus. No entanto, ambos têm maneiras bastante diferentes de abordar esta Festa, o que reflete suas diferentes perspectivas sobre a Mãe de Cristo, nosso Deus. Seus enfoques litúrgicos são diferentes entre si, assim como os próprios termos pelos quais denominam esta Festa.
O Ocidente Católico chama esta Festa de “Assunção” ou a assunção do corpo e da alma da Virgem Maria ao Céu por Deus.
A imagem católica correspondente desta festa é a Mãe de Deus sendo levada ao céu em uma nuvem e por anjos. Ela é então coroada pela Santíssima Trindade ou Seu Filho como a Principal Intercessora da Igreja diante do Trono Divino.
O Oriente Ortodoxo, por outro lado, concentra-se no próprio “adormecer” ou morte da Mãe de Deus (ou seja, “Dormição”).
O foco do Oriente Cristão se encerra no Ícone da Dormição, onde a atenção central está no esquife em que a Mãe de Deus repousa, cercada pelos Apóstolos e Padres da Igreja, seus sucessores.
Cristo está posicionado acima do esquife, segurando em Suas Mãos a imagem de Sua Mãe, a quem Ele está levando para o Céu, em corpo e alma. Às vezes, os ícones da Dormição retratam a Mãe de Deus já lá em cima, no céu, com a Santíssima Trindade.
Alguns ícones da Dormição retratam um membro da tradição, chamado “Atônio”, que tentou atacar o esquife da Mãe de Deus e teve suas mãos decepadas por um anjo. As mãos estão presas ao esquife enquanto o perplexo Atônio está prestes a se arrepender de sua ação.
Outros ícones da Dormição retratam os Apóstolos sendo trazidos pelos ares por anjos de suas missões distantes para assistir ao funeral da Mãe de Deus.
O Ocidente Católico Romano tenta sequer pensar na “morte de Maria”. Sua doutrina da Imaculada Conceição, onde o Pecado Original penal (culpa herdada pelo pecado de Adão) não “infecta” a alma de Maria, devido ao Seu papel futuro exaltado como Mãe do Salvador. E já que o pecado de Adão é o que trouxe a morte ao mundo, se Maria não o “contraiu”, então como se pode dizer que Ela morreu, ou seja, uma experiência de punição por um pecado do qual não teve participação?
Ao definir a doutrina da Assunção, o Papa Pio XII deixou em aberto a questão de se Maria de fato “morreu” ou não. Em certo sentido, ele foi constrangido pela doutrina da Imaculada Conceição a fazê-lo.
Isso explica por que apenas a assunção da Mãe de Deus ao céu é celebrada pela Igreja Romana e por que não há menção ou comemoração de sua morte.
Para a Igreja Oriental, a Mãe de Deus foi verdadeiramente concebida e nasceu em toda a santidade e graça, e é por isso que Sua Natividade é celebrada liturgicamente, assim como Sua Concepção no ventre de Sant´Ana, visto que somente a festa de um santo pode ser celebrada.
Para a Igreja Oriental, o Pecado Original tem a ver com as consequências do pecado de Adão que todos nós contraímos. Não herdamos a culpa do pecado pessoal de Adão, visto que somente Adão é responsável por isso. Mas, como descendentes de Adão, herdamos uma natureza humana que foi enfraquecida por essa desobediência a Deus e que está sujeita às leis da morte.
Portanto, para a Igreja Oriental, as consequências do Pecado Original e a grande santidade de Maria não são realidades teológicas mutuamente exclusivas.
Nossa herança litúrgica sempre celebrou Seu “funeral” antes de celebrar Sua ascensão ao Céu. A Dormição, assim chamada também para indicar o repouso abençoado no Senhor que a Santíssima Mãe de Deus teve, é uma comemoração da morte e ressurreição em Cristo da Virgem Maria.
Ela experimenta no “agora” o que nós também devemos experimentar: nossa morte e ressurreição pessoal em Cristo, em corpo e alma.
A presença de Cristo junto ao esquife de Sua Mãe é também uma ilustração da visão de nossa Igreja sobre o estado imediato da alma após nossa presença no Senhor.
Seremos “testados” pelos espíritos do ar com os quais lutamos, mesmo agora, durante nossas vidas aqui.
A Mãe de Deus, por tradição, pediu a Seu Filho que não fosse submetido aos terrores dessa experiência. A presença de Cristo junto ao esquife de Sua Mãe é, portanto, uma resposta à oração d´Aquela cujos pedidos são atendidos por Cristo!
Ela é certamente recebida no Céu e coroada como a Mãe da Igreja, o Corpo de Cristo. Ela é, portanto, a Mãe de todos e de cada um de nós. Isso aconteceu, na realidade, no momento em que o próprio Cristo nos entregou Sua Mãe a São João, aos pés da Cruz.
A cada um de nós, Cristo Crucificado diz: “Eis a tua Mãe!”
Cristo nos deu tudo o que podia e tinha em Seu poder para nos dar. No final, quando não tinha mais nada para nos dar, Ele nos enriqueceu com o tesouro de Sua própria Mãe e Sua poderosa e maternal intercessão e proteção sobre nossas vidas vividas em Cristo!
A Encarnação de Deus em Cristo não é uma ilusão. Ilusões não têm mães.
É por isso que o termo “Theotokos” ou “Aquela Que deu a luz a Deus” é uma verdadeira pedra de toque da Ortodoxia. Chamar de bendita Aquela que gerou por nós o Verbo de Deus Encarnado é celebrar toda a dispensação da Salvação de Cristo!
Certo poeta escreve outrora: “Que honra se deve prestar Àquela Mulher que teve Deus por Pai, Esposo e Filho?”
É também por isso que nos preparamos para a celebração do mistério do repouso e ressurreição da Mãe de Deus com uma Quaresma especial de duas semanas antes do dia da Festa.
Em muitas igrejas existe a tradição do Sudário ou Mortalha (Plaschanitsya ou Epitáfio) da Dormição.
Isto imita o Sudário de nosso Senhor venerado durante a celebração pascal.
O Sudário da Mãe de Deus A representa em repouso abençoado e é colocado em um local sagrado semelhante no meio da Igreja no dia da festa. As antífonas comoventes e lacrimosas do Funeral da Mãe de Deus são cantadas lenta e dolorosamente.
“Para onde vais hoje, Mãe? Por que nos deixas?”, a Liturgia nos convida a chorar naquele dia.
Tornamo-nos como as crianças que Cristo deseja que sejamos para herdar o Reino dos Céus. E, como crianças, choramos por nossa Mãe que repousou e está nos deixando.
Mas sabemos que a Mãe de Deus não nos abandonou e estará no Céu como nossa verdadeira Mãe Espiritual para ajudar a formar Cristo, Seu Filho, em nós. Ela estará conosco a cada passo do nosso caminho para garantir que não tropecemos muito e para segurar nossa mão enquanto Ela nos conduz a uma união mais perfeita com Seu Filho e a Santíssima Trindade.
O Sudário da Mãe de Deus é frequentemente guardado em uma capela lateral ou separado em muitas de nossas igrejas, especialmente aquelas que são dedicadas à Santa Dormição.